O primeiro grupo seria feito por pessoas felizes, sorridentes, que usam roupas coloridas e que nunca têm tempo para comprar uma tapioca naquela barraquinha ali do lado. A segunda parte – ao qual eu pertenço – contém pessoas tristes, angustiadas, que andam de preto e que sempre contam moedinhas para comer a tapioca.
– De queijo, por favor, seu Zé.
A saga de se esperar o ônibus começa quando eu piso no ponto e o vejo lotado. O fato de haver muitas pessoas ali me faz imaginar (não sei por que) que hoje finalmente ele passará mais rápido. Há um clima no ar: em dez minutinhos ele aparece, chegarei cedo em casa, vou comer aquele belo sanduíche que minha mãe está fazendo e, finalmente, dormir!
Os dez minutinhos se passam, os outros ônibus também, levando as pessoas felizes. E eu lá: mais cinco minutos e ele chega, não tem erro. Já estou até ouvindo o barulho característico que ele faz.
Quinze minutos: nesse momento vejo a senhora que pega o mesmo ônibus que eu. Não a conheço, não sei o seu nome, e nem se vende perfumes do Avon; mas nos damos bem, isso que importa. Aí nós trocamos o diálogo que se repete todos os dias, sem exceção:
– Tá demorando hoje, né? – eu pergunto.
– É verdade, será que quebrou pelo caminho? – ela diz.
Nos olhamos. Todas as pessoas que esperam ônibus demorados entendem esse olhar. Como assim quebrou? Será? Mas aí vai demorar umas duas horas! Não pode ser. E o meu sanduíche?
Trinta minutos: não tem mais ninguém no ponto. Apenas eu, a senhora que espera juntamente comigo, o Zé da tapioca e uma louca ali do lado que acredita ser recepcionista de hospital.
Quarenta minutos: eu desisto! Minha vida é uma bosta, trabalho demais, ganho pouco, durmo menos ainda, meu tênis está furado e ainda sou obrigado a comer essa tapioca horrível que o Zé faz. Tudo isso, sabe por quê? Porque a porcaria do ônibus não passa no horário certo.
É aí que o milagre acontece: escuto lá de longe o barulhinho do danado. Será que é ele, o meu ônibus? Logo vejo aquele letreiro brilhante, lindo. É ele mesmo.
– Estive esperando por você – eu digo para o ônibus, com a voz embargada.
Ele não responde, apenas estaciona, eu entro e esqueço meus problemas: agora só penso no sanduíche que está à minha espera.