sábado, 17 de julho de 2010

Prova de fogo

Se não bastassem o vestibular e as provas da faculdade, todo jornalista faz algum processo seletivo para entrar numa grande redação. O camarada, preocupado com o futuro e com o bolso, se inscreve para participar desses famosos programas de trainee.

Foi o que fiz, pois meus dias na faculdade chegam ao fim e, infelizmente, não tenho mais dinheiro nem para um pastel de feira.

Me preparei, estudei, fiz exercícios de lógica (aqueles que você tem de descobrir quais são as cores dos vestidos de três debutantes, sabendo apenas que uma delas usa um sapato marrom), decorei o nome das últimas 741 guerras da humanidade, consegui guardar quais são os ministros do Lula e, para meu espanto, memorizei também as suas funções.

Pois bem, chegou o dia da prova. Não digo que acordei às 5h da madrugada porque, na verdade, eu não dormi. Depois, comi aquele belo sanduíche de salame com queijo – nada muito pesado, como orientam os especialistas em preparação para provas importantes – e fui embora.

No caminho, a gente sempre pensa que ninguém vai à prova, afinal está chovendo e faz um frio lascado. Quem é o idiota que levantará às 5h para fazer uma provinha de trainee num dia feio desses? Chuto umas 13 pessoas, no máximo. Minha vaga está garantida.

Chegando ao local, vem a decepção: dois mil candidatos! Não vou passar! Por que eu, um cara feio e sem grandes atributos, chegarei à frente desse pessoal da USP, da Unicamp e de Harvard? Logo eu, que sou de faculdade particular, vou conseguir? É melhor ir embora, me desculpe.

Passado o desânimo, percebo que muita gente se conhece. Esse povo vem em bando, para piorar minha situação. Alguns estão sozinhos, é claro, mas lêem alguma coisa para me intimidar. Não entendo qual é a necessidade de ler Proust numa hora dessas. Logo hoje esqueci a minha piauí.

Tento analisar algumas pessoas, pois saberei antes quem são meus concorrentes diretos. Aquela garota de óculos já passou, com certeza. Há um rapaz de camiseta do Weezer que leu muito mais livros que eu. E esse cara de terno, hein? Por que se vestir assim num dia de prova, deus?

A moça dos Recursos Humanos convida todos a entrar. Como ela é simpática, não? Explica quais são os benefícios, quanto é o salário, quem são os chefes etc. Só não fala do trabalho, que deve ser o mais importante.

Entro na sala e escolho um lugar lá no fundo. O rapaz do terno faz uma piadinha em voz alta para descontrair a galera. Pra ele é fácil, né, já conseguiu passar... A moça do RH entrega a prova e faz cara de má.

Agora vou parar de pensar besteira, não? Há coisas importantes a fazer.