Eu só tinha vivido dois momentos realmente perigosos nos últimos 19 anos: quando um carro passou por cima dos meus pés e o dia em que uma pedra perdida acertou a janela do ônibus onde eu estava. Eis que, depois de meses de sossego e muita água de coco bebida, eu ouço a seguinte frase:
– Passa o celular, mano. Isso é um assalto.
Não é que eu achasse o momento inadequado para o pedido em questão, mas, convenhamos, assaltar uma pessoa às 18h30 é algo esquisito, ainda mais se for em frente ao cemitério perto da minha casa. Não combina. Assaltos acontecem à noite, em ruas desertas, sujas, com música de suspense no fundo, e não em locais como a rua do cemitério.
– Que isso, mano, o celular não – eu falei tentando convencer o ladrão.
E eu me orgulhava de poder dizer que sou um dos poucos paulistanos nunca assaltados. Nunca me apontaram uma arma, muito menos uma faca ou objeto cortante. Não tive a oportunidade de participar de nenhum sequestro (relâmpago ou não), nenhuma perseguição com carros, assaltos a bancos, tiroteios no Velho Oeste. Nada. No português vulgar, eu era virgem pra essas coisas.
– Passa o celular, mano, ou então vou te meter bala, tá ligado? – ele disse, me mostrando a arma por debaixo da camisa. – Vamos andando porque vem gente aí, no caminho você me passa o celular – sugeriu.
Andamos então. E nesse momento, toda a filosofia de Jack Bauer entrou na minha cabeça. “E se eu fugir? Sair correndo, sei lá. Geralmente esses bandidos são ruins de pontaria, ele não vai me acertar. Eu posso pular o muro do cemitério E se ele me matar? Aí danou-se, mas já estando no cemitério, não tem problema, fico por lá mesmo; é só enterrar.”
– Você é roqueiro, mano? – me perguntou o ladrão enquanto andávamos.
– Não.
– E essas roupas aí? – indagou. Eu vestia uma mísera camisa pólo, uma calça jeans e um All Star velho.
– Nem sou roqueiro, cara, mas curto o som sim.
Fomos andando, andando... E o papo nos deixando quase íntimos. Nada de ele pegar o celular. O bandido até me fez uma confissão:
– Mano, eu nem curto roubar, tá ligado? Minha parada é traficar.
– Entendo.
Eu queria acabar com tudo logo. “Me assalta de vez, porra. Leva a merda do celular embora. Deixa eu sair daqui, pegar o ônibus e beber uma cerveja em paz. Que merda, não sou psicólogo de ladrão”.
– E aí, você tá indo aonde? – ele perguntou.
– Encontrar a minha mina. – na verdade, eu ia sair com o Sato e com a Tati, mas achei que “sair com a mina” era mais apropriado para o momento.
– Ah, é? Mano, você é gente boa. Nem vou levar seu celular, tá ligado? Me dá um dinheiro aí, porque eu sei que você tem, e eu vou embora.
Eu, um pobre coitado, tinha vinte reais no bolso. Estava contado para as despesas da noite. Mas é melhor dar vinte do que perder o celular. Entreguei a nota para ele.
– Aí, mano, não é pra correr atrás de mim. Senão te meto bala, tá ligado?
– Tô ligado.
– Cara, você é firmeza. Quer saber, vamo ali no bar e a gente troca essa nota de vinte. Cada um fica com dez, beleza? – disse.
O cara me assalta e ainda quer me dar o troco? Que estranho. Os assaltantes estão mudando. Culpa da crise, talvez. Falta dinheiro circulando, o crédito diminuiu, as empresas estão demitindo. A marolinha virou tsunami, até os bandidos estão sentindo os impactos. Temos que dividir o nosso dinheiro para um longo inverno, como dizem por aí os políticos.
Ah, no final ele não trocou o dinheiro por medo do dono do bar o reconhecer. Quanta insegurança, não é? Apertou a minha mão e foi embora. Pobre ladrão, talvez ele só quisesse conversar.
– Passa o celular, mano. Isso é um assalto.
Não é que eu achasse o momento inadequado para o pedido em questão, mas, convenhamos, assaltar uma pessoa às 18h30 é algo esquisito, ainda mais se for em frente ao cemitério perto da minha casa. Não combina. Assaltos acontecem à noite, em ruas desertas, sujas, com música de suspense no fundo, e não em locais como a rua do cemitério.
– Que isso, mano, o celular não – eu falei tentando convencer o ladrão.
E eu me orgulhava de poder dizer que sou um dos poucos paulistanos nunca assaltados. Nunca me apontaram uma arma, muito menos uma faca ou objeto cortante. Não tive a oportunidade de participar de nenhum sequestro (relâmpago ou não), nenhuma perseguição com carros, assaltos a bancos, tiroteios no Velho Oeste. Nada. No português vulgar, eu era virgem pra essas coisas.
– Passa o celular, mano, ou então vou te meter bala, tá ligado? – ele disse, me mostrando a arma por debaixo da camisa. – Vamos andando porque vem gente aí, no caminho você me passa o celular – sugeriu.
Andamos então. E nesse momento, toda a filosofia de Jack Bauer entrou na minha cabeça. “E se eu fugir? Sair correndo, sei lá. Geralmente esses bandidos são ruins de pontaria, ele não vai me acertar. Eu posso pular o muro do cemitério E se ele me matar? Aí danou-se, mas já estando no cemitério, não tem problema, fico por lá mesmo; é só enterrar.”
– Você é roqueiro, mano? – me perguntou o ladrão enquanto andávamos.
– Não.
– E essas roupas aí? – indagou. Eu vestia uma mísera camisa pólo, uma calça jeans e um All Star velho.
– Nem sou roqueiro, cara, mas curto o som sim.
Fomos andando, andando... E o papo nos deixando quase íntimos. Nada de ele pegar o celular. O bandido até me fez uma confissão:
– Mano, eu nem curto roubar, tá ligado? Minha parada é traficar.
– Entendo.
Eu queria acabar com tudo logo. “Me assalta de vez, porra. Leva a merda do celular embora. Deixa eu sair daqui, pegar o ônibus e beber uma cerveja em paz. Que merda, não sou psicólogo de ladrão”.
– E aí, você tá indo aonde? – ele perguntou.
– Encontrar a minha mina. – na verdade, eu ia sair com o Sato e com a Tati, mas achei que “sair com a mina” era mais apropriado para o momento.
– Ah, é? Mano, você é gente boa. Nem vou levar seu celular, tá ligado? Me dá um dinheiro aí, porque eu sei que você tem, e eu vou embora.
Eu, um pobre coitado, tinha vinte reais no bolso. Estava contado para as despesas da noite. Mas é melhor dar vinte do que perder o celular. Entreguei a nota para ele.
– Aí, mano, não é pra correr atrás de mim. Senão te meto bala, tá ligado?
– Tô ligado.
– Cara, você é firmeza. Quer saber, vamo ali no bar e a gente troca essa nota de vinte. Cada um fica com dez, beleza? – disse.
O cara me assalta e ainda quer me dar o troco? Que estranho. Os assaltantes estão mudando. Culpa da crise, talvez. Falta dinheiro circulando, o crédito diminuiu, as empresas estão demitindo. A marolinha virou tsunami, até os bandidos estão sentindo os impactos. Temos que dividir o nosso dinheiro para um longo inverno, como dizem por aí os políticos.
Ah, no final ele não trocou o dinheiro por medo do dono do bar o reconhecer. Quanta insegurança, não é? Apertou a minha mão e foi embora. Pobre ladrão, talvez ele só quisesse conversar.